As laranjas da Sabina
Havia pouco mais de um ano que a escravidão fora abolida no Brasil. Sabina, uma mulher negra e pobre, trabalhava nas ruas do Rio de Janeiro como quitandeira. Seu ponto ficava no largo da Misericórdia, em frente à Escola de Medicina. Expostas em tabuleiros sustentados por barris, as frutas aliviavam o calor diário de estudantes encasacados e metidos a republicanos radicais.
Em julho de 1889, as iguarias tiveram outra função: bananas, tomates e laranjas sarapintaram a diligência oficial do ministro da Fazenda, visconde de Ouro Preto, quando cruzou a rua da escola. Na manhã seguinte, o subdelegado regional Jacome Lazary ordenou o fechamento da quitanda.
O ato gerou indignação e estimulou a imaginação dos estudantes. No dia 25 de julho, com laranjas espetadas em bengalas, eles saíram em cortejo pelas ruas do Centro. À frente, um estandarte ostentava coroa feita de bananas e a frase “Ao Exterminador das Laranjas”. A passeata saiu do largo da Misericórdia e percorreu a rua Primeiro de Março até a rua do Ouvidor.
Depois de aplaudir as redações de jornais republicanos, os manifestantes cruzaram a rua Uruguaiana, encontraram os alunos da Politécnica no largo de São Francisco e percorreram o caminho de volta. Não houve confronto nem quebra-quebra. E quando alguém aproveitou o alvoroço para gritar impropérios contra Sua Majestade, os estudantes foram argutos o bastante para responder que aquela não era uma manifestação política, mas sim… agrícola.
A adesão popular e a repercussão na imprensa constrangeram o subdelegado Lazary, que pediu demissão. Sabina pôde retomar o ponto. E a imagem do Império, que já andava desgastada, ganhou mais um arranhão.
Este texto foi elaborado pelo pesquisador Danilo Araujo Marques do Projeto República (UFMG).
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