Clubes Dançantes
“Rio de Janeiro, a cidade que dança”.
A afirmação acima é de Olavo Bilac e descreve muito bem a atmosfera do Rio entre o final do século XIX e início do XX, momento em que, nas palavras do poeta, a dança tornou-se “mais do que um costume ou um divertimento, ela poderia ser sentida como uma paixão, uma mania, uma febre!”
A “febre dançante” invadiu o Rio de Janeiro e ganhou força no começo do século XX, com a explosão do número de associações e clubes recreativos, principalmente entre 1906 e 1912. O lazer era característica principal dessas associações que, além de proporcionar momentos de diversão, funcionavam também como espaço de sociabilidade, solidariedade mútua e exercício da cidadania. Muitas delas realizavam bailes e desfiles carnavalescos.
Cada clube ou associação trazia no nome o bairro de origem, os desejos de progresso e melhoria para o território ou mesmo características dos sócios, geralmente atrelados aos termos “dançante” ou “carnavalesco”, já que a atividade principal, em tese, era o lazer. Assim, surgiram clubes como o Estrela da Piedade; Grêmio Musical Dançante Mistérios de D. Clara (em alusão à antiga estação ferroviária no bairro de Madureira); Triunfo do Engenho de Dentro; Progresso do Engenho de Dentro; Audaciosos do Caju e os Heróis da Piedade.
Compostos pela população pobre e trabalhadora, os clubes tinham entre seus associados, uma maioria de homens negros que residiam próximo às sedes. Mas, para além de espaços de lazer e festas, as associações se constituíram como lugar de construção identitária e de cumplicidade entre os membros, que reuniam-se para discutir e questionar as condições de vida, trabalho e a falta de assistência por parte do Estado.
Lazer e militância se encontravam nos clubes dançantes dos operários. Por algumas vezes, as atividades dos clubes eram suspensas ou mesmo suas sedes serviam de espaço de reunião para atividades políticas de outros trabalhadores, como por exemplo durante a greve dos operários da Companhia de Gás, situada nas imediações do “Clube Carnavalesco Luz do Povo”, na região da Cidade Nova, em 1908.
Já a “Sociedade Dançante Carnavalesca Recreio das Flores”, fundada em 1909 na mesma região, costumava abrigar reuniões de trabalhadores, assim como os que faziam parte do grupo dos carbonários ligados à Sociedade União dos Operários Estivadores. Ao participarem ativamente da passeata promovida em 1914 pelos grêmios operários da cidade na celebração do 1º de maio, deixaram ainda mais evidente sua ligação com a causa dos trabalhadores, mostrando que eram espaços cotidianos de luta por seus direitos.
Mas o pensamento racista que estrutura a sociedade carioca e brasileira, no geral, considerava essas sociedades espaços de desordem e perigo – visão ecoada pelas ações da polícia e por parte da imprensa. Em 1926, por exemplo, a Sociedade Dançante Carnavalesca Reinado de Siva, da Cidade Nova, foi descrita no periódico A voz do Chauffeur como uma das sociedades de pior fama da capital, sendo frequentada “pela fina flor da malandragem”, além de “um local de encontro de malandros e prostitutas” e “antro de crime e vadiagem”.