Hospital Carlos Chagas
Autoras: Ana Clara Ferreira, Yasmin Oliveira, Vitória Durães, Maria Eduarda Araújo e Melissa Mello.
Carlos Chagas foi um médico sanitarista, conhecido mundialmente por ser o único em toda a história a descrever, sozinho, uma doença de forma completa — a doença de Chagas. Ele trabalhou em diversas cidades do interior, onde se indignou com o abandono e a vulnerabilidade das populações rurais do Brasil. Diretor da Fundação Oswaldo Cruz, foi indicado ao Nobel de Medicina duas vezes, tendo sido o primeiro brasileiro a receber o título de Doutor Honoris Causa por Harvard. Seu nome foi dado a uma cidade de Minas Gerais.
O Hospital Carlos Chagas, o mais antigo hospital estadual do Rio de Janeiro, foi nomeado em sua homenagem e inaugurado em 26 de junho de 1937, no bairro de Marechal Hermes. O hospital, que atualmente possui 84 anos, carrega em si a história de inúmeros funcionários, pacientes e moradores de Marechal.
Com o intuito de divulgar histórias desconhecidas, escolhemos entrevistar uma ex-funcionária do hospital – Djalmina Cunha de Barros, parente de uma das componentes do grupo que trabalhou no Carlos Chagas por 30 anos.
- Quando você começou a trabalhar no Carlos Chagas? Quantos anos foram?
Eu trabalhei, contando o estágio, de 1968 até 1999. Comecei no curso de auxiliar de enfermagem, SETA. Em 1970 fui contratada pela SUSEME. No Hospital? No Hospital Estadual Carlos Chagas. Minha vida foi toda Carlos Chagas. Trabalhei até 18 de novembro de 1999. O tempo de curso já contava para aposentadoria por ser remunerado. Foram 30 anos.
- Em quais áreas a senhora trabalhava?
Eu trabalhei no centro cirúrgico, na maternidade, clínica cirúrgica de homens, clínica cirúrgica de mulheres, pronto socorro, CTI, supervisão de enfermagem e central de material e esterilização. - Durante seus anos no Carlos Chagas, houve mudanças no hospital? Se sim, elas foram para pior ou para melhor?
Sim, para melhor. Muitas melhorias: construção de central de material nova, centro cirúrgico novo. As enfermarias foram todas reestruturadas. - Como era a condição do trabalho nessas áreas antes? Era bom de trabalhar ou ficou mais fácil depois da melhoria?
Sim, ficou mais fácil de trabalhar. Mas, o que tinha de bom era que o povo que trabalhava era humanizado. Davam mais amor ao paciente e o trabalho era de primeira. - Você lembra de algum caso específico que aconteceu no hospital?
Muita coisa a gente não pode falar por conta do sigilo profissional. Mas, por exemplo, no Carlos Chagas, acontecia de gente chegar baleada… os trens, teve uma batida de trem, então tiveram muitos feridos, muita amputação. Foi em 1970… acho que foi em 1975, o desastre de trem. Eu estava em casa, com o meu marido, fomos pro hospital ajudar. A gente morava aqui em Marechal. Foi trágico. Muita gente machucada, muito corre-corre. Eu ia correndo, porque o material do Carlos Chagas não era suficiente. - Em sua maioria, como eram os pacientes do hospital?
Em um hospital de clínica médica, ortopedia, ginecologia, queimado, tem todo tipo de paciente. Pacientes graves, pacientes estáveis. Geralmente era gente de classe baixa ou média. Mas o hospital já atendeu deputados, que ficavam em quartos separados. Tinha todo tipo de pessoa. - Já houve falta de materiais ou médicos no hospital? Quando isso acontecia, qual era a condição de trabalho das enfermeiras?
Muito. Material faltava muito. Quando faltava material, como chefe de esterilização, eu tinha que providenciar, junto ao setor de material, papel para esterilizar material para todo setor. Eu saía na funerária pedindo. O dono da funerária cedeu muito papel para o Carlos Chagas… assim como cedia sabão para a lavanderia, que não tinha sabão para lavar as roupas do paciente. Gaze, compressas, eu ia muito na Fleming pedir. A maternidade Alexander Fleming fazia doações incríveis, eu sempre peguei lá. Os outros, o setor de material, tentava pegar emprestado de outro lugar. Mas faltava seringa, agulha, esparadrapo, faltava muita coisa. - Você acha que os profissionais da saúde eram valorizados naquela época?
A gente era valorizado em salário, porque o salário dava pra gente viver. Depois de um certo tempo, a gente já não recebia tanto. Vai mudando o salário, você com dois filhos, tem que pagar a escola, acaba aumentando o tanto de trabalho. Trabalhava de noite, trabalhava dia, o que me chamasse, tô indo. Mas eu fazia porque eu amo a minha profissão. Trabalhava por amor. Eu sei que eu fui boa chefe, porque eu só recebo elogio. Eu nunca maltratei ninguém, sempre tentei entender a vida delas, ajudar, porque é a função de cada um ajudar. Então, o serviço fluía. Porque era um trabalho de equipe, de amor, de amizade. Se alguém estivesse com problema, eu tentava resolver… e ajudava outras pessoas. Porque também não tinha só a parte de enfermagem. Você também tem que saber lidar com o ser humano, tanto os doentes, quanto os funcionários. Ai, isso foi poético. Foi (risos). Eu trabalhei por amor. Eu gostava de dinheiro, mas amava a minha profissão. - Qual é a importância do hospital no bairro? Como ele afetava, e ainda afeta, a vida dos moradores?
O hospital é de grande importância para o bairro e para a adjacência. No passado, não tinha Clínica da Família, não tinha nada, era só o Carlos Chagas. Então tudo, todas as doenças, pediatria, ginecologia, tudo era resolvido no Carlos Chagas. E graças a Deus, tinha excelentes médicos. A equipe médica, a equipe de enfermagem, era excelente. Uns ajudavam os outros. Tanto técnico de enfermagem quanto atendente… era um trabalho de equipe. Tinha o pessoal do laboratório, raio-x. O Carlos Chagas tem um apelido, é o Casão. Era uma casa, todo mundo se dava bem, todo mundo se entrosava, uma família. É conhecido até hoje como Casão.
Até hoje o Hospital Carlos Chagas tem grande importância para o bairro de Marechal Hermes, realizando cerca de 5.000 cirurgias e atendendo aproximadamente 60.000 pessoas por ano. É extremamente significativo ver uma instituição construída, composta, amada e utilizada pelos moradores do bairro, após tantos anos de funcionamento.
Mas sua importância não se restringe aos seus serviços médicos, uma vez que também é responsável por carregar parte da história de Marechal. Em poucas palavras, pode-se dizer que o Hospital Carlos Chagas conta um pouco da história de cada pessoa que passou por ele – seja funcionário, paciente, visitante. Suas paredes mantêm a memória de inúmeros moradores viva, eternizada nas lembranças do local.
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