Reis do Oriente
Diz o povo que a simpatia das sementes de romã na festa de Santos Reis, no dia 6 de janeiro, é tiro e queda contra a pindaíba. A romã aparece em várias culturas como uma fruta capaz de garantir a prosperidade e a fecundidade, em virtude de sua grande quantidade de sementes. A tradição judaica garante que são 613 sementinhas; mesmo número dos “mitzvotis”, os provérbios sagrados da Torá. O suco de romã é tomado em regiões da Índia como um propiciador da fertilidade feminina. O Brasil herdou de Portugal a tradição de que devemos retirar da romã nove sementes no Dia de Reis, com rogações a Baltazar, Gaspar e Belchior. Três sementes devem ser comidas, três devem ser ofertadas e três devem viver dentro de carteiras onde se leva o dinheiro.
A nossa tradição do Dia de Reis é ibérica. A festa é muito forte na Espanha e em Portugal, onde grupos de foliões visitam as casas dos devotos com estandartes e instrumentos musicais. Munidos de violas, pandeiros, reco-recos, sanfonas, chocalhos, cavaquinhos e triângulos, os foliões entoam músicas em louvação aos Santos Reis e recebem, em troca, oferendas propiciatórias ao festejo.
Geralmente, as folias formam-se em consequência de promessas feitas e graças alcançadas pela ação dos magos. O pagamento da promessa inclui a obrigação de angariar recursos financeiros para manter uma folia por até sete anos. Além dos músicos e cantores, muitas folias são compostas por palhaços, dançarinos e personagens das tradições locais, transformando-se em autos dramatúrgicos de celebração comunitária e encantamento da vida como dádiva, gentileza e oferenda.
A Folia de Reis é das manifestações mais fortes do ciclo do Natal na cidade do Rio de Janeiro. Redutos de foliões, como os morro da Formiga, o morro Dona Marta e o morro da Mangueira, mobilizam de crianças a idosos para saudar os magos. A influência é tamanha que o toque de caixa da folia de Reis é um dos elementos característicos da bateria da Estação Primeira de Mangueira.
Dados a cismar com os entremeios da história, com as mandingas inscritas nos não ditos e avivadas na festa, nos pegamos a pensar a força da Folia de Reis no encontro do nascimento do menino Deus com os reis da magia. Matutemos juntos com a ideia de que Baltazar, Gaspar e Belchior seguiram rotas inscritas no céu para ir ao encontro do menino Jesus. Matutemos ainda com a ideia de que não foram mirra, ouro e incenso os presentes destinados ao menino, mas talvez a amarração do próprio mistério atada no encontro de Jesus com os reis do Oriente. Mistério esse que baila nos morros do Rio avivando não somente os encantos do nascimento, mas também esperança, alegria e festa.