O transporte alternativo
O transporte público do Rio de Janeiro possui problemas crônicos desde o século XIX. E quem mais tem a se queixar, desde sempre, é mesmo a população dos subúrbios. É nesse contexto secular, de demandas não supridas, que surge uma forma de locomoção que o suburbano carioca conhece tão bem: os meios de transporte alternativo.
Nos anos 1950 e 60, eram as “lotações”: veículos de propriedade particular do “chofer” ou de pequenas empresas, alguns levando até sete passageiros; já outros eram quase do tamanho dos ônibus convencionais. Nas décadas de 1970 e 80, eram as Kombis que enchiam as vias principais do Rio de Janeiro. Mas nada se compara ao fenômeno das vans, que há quase duas décadas tem os rumos do subúrbio carioca como seu principal destino
A história das vans no Rio de Janeiro remonta aos anos 1990. Para além da demanda crônica por atendimento às áreas mais negligenciadas pelo poder público, uma série de fatores contribuiu para o boom das vans. Um deles foi a implementação do Real como nova moeda no Brasil, que à época valia mais que o Dólar e favorecia a importação de produtos — dentre eles as vans, produzidas principalmente por montadoras japonesas e coreanas, e que invadiram as ruas do Rio de Janeiro em 1995.
Não demorou nada para que esse modelo se tornasse um modal popular nos subúrbios. Afinal, o passageiro ia com mais conforto, as viagens eram mais rápidas, a espera entre uma van e outra era menor e (o mais importante), muitas vezes era a única forma de se chegar até muitos bairros. Porém, a história do transporte de vans é marcada pela linha fina entre o legal e o legítimo, onde muitas vezes os processos licitatórios abertos pelo Estado acabam excluindo milhares de trabalhadores, que acabam atuando irregularmente.
Andar de van no Rio de Janeiro não raro significa viver uma aventura, e praticamente todo suburbano sabe como é estar dentro desse meio de transporte. Se por um lado ninguém vai (ou deveria ir) em pé, como nos trens e ônibus, nem por isso o passageiro não deve se segurar bem durante a viagem. Nas vans é bom conferir se os cintos (quando os há) estão afivelados pois o puxa-e-vai, as altas velocidades e as curvas aceleradas fazem parte da corrida nesses carros.
Todo suburbano carioca conhece bem essa sequência de sons: à beira do ponto de ônibus uma voz anuncia a chegada do veículo e grita os destinos (“Santa Cruz!”, “Madureira!”, “Campo Grande”, ou qualquer um de uma infinidade de bairros). Antes da adoção do sistema de bilhete eletrônico pelas vans, o cobrador era figura carimbada nesse transporte — e continua sendo em muitos casos. Não é questão de simplesmente receber as tarifas e distribuir os trocos, mas há todo um gerenciamento a ser executado: desde informar o itinerário e “fisgar” passageiros na rua até a responsabilidade pelo abre e fecha da porta de correr. Fundamentos básicos no dia-a-dia das vans, mas que há de se ter destreza e malícia.
Não há como negar: difícil encontrar algum suburbano usuário de vans que não tenha vivido uma situação ou presenciado uma cena nesses veículos que lhe fez pensar “isso aqui, só no Rio de Janeiro!”. Entre uma risada nervosa, um bate-boca acalorado e perrengues compartilhados, os caminhos para o subúrbio são preenchidos.