Tia Maria e o Jongo da Serrinha

Tia Maria, a jongueira mais longeva do Rio. Foto: Cris Isidoro/ Diadorim Ideias

No dia 14 de maio de 2019, Tia Maria subiu no palco do Copacabana Palace e recebeu em mãos o prêmio “Sim à Igualdade Racial”, promovido pelo Instituto Identidades Brasileiras. No alto de seus 98 anos, elegantíssima em seu vestido turquesa, Tia Maria agradeceu a homenagem, e discursou em tom sereno: “O Jongo da Serrinha agradece e terá um grande prazer, se vocês um dia puderem passar uma tarde com a gente lá. O jongo é bom. Vocês vão gostar”. Quatro dias depois, durante uma roda de jongo, Tia Maria teve um mal estar, e veio a falecer no mesmo dia.

O prêmio concedido à Maria de Lourdes Mendes, a Tia Maria, era uma reverência à uma  história de luta pela preservação da cultura negra no Rio de Janeiro. Tia Maria fez parte da primeira geração de moradores nascidos no morro da Serrinha, quando o bairro de Madureira, na Zona Norte do Rio, ainda era uma área rural, no início do século XX. Além de ser uma das fundadoras da GRES Império Serrano — agremiação na qual desfilou até o fim de sua vida —, por décadas (e até seu último suspiro) Tia Maria foi a principal referência do jongo na cidade e no país.

O jongo desembarcou no Rio junto com negros bantus, vindos de Angola, no século XIX. O jongo é uma dança que se faz em roda, ao som de tambores e canto de pontos, com os corpos brincando em giros e umbigadas. Para muitos especialistas, o jongo foi uma forte influência — ou até um elo ancestral — para o nascimento do samba. O toque dos tambores do jongo — são três: o Caxambu, o Candongueiro e o Angoma Puíta — é sagrado: deve-se pedir licença e tomar a benção deles antes de entrar numa roda. Afinal, o tambor é produzido pela junção de duas vidas ceifadas — o couro animal e a casca da árvore —, que têm o poder de se transformar em uma nova entidade, trazendo a alegria da vida através do toque ancestral. Em 2005 a cultura jongueira é considerada pelo Iphan patrimônio imaterial do Brasil. 

No Rio de Janeiro, a preservação dessa tradição se deve e muito aos esforços do grupo cultural Jongo da Serrinha, em Madureira, fundado pela lendária Vovó Maria Joana Rezadeira, e seu filho, Mestre Darcy do Jongo, na década de 1960. Até então, o jongo era dançado pelos mais velhos nos quintais e terreiros do morro da Serrinha, em Madureira. Vovó Maria Joana percebeu que aquela tradição seria perdida se a dança não incluísse os mais novos — que assistiam, escondidos, mas sem poder participar — na roda. 

A passagem do jongo, de geração à geração. Disponível em https://jongodaserrinha.org/historia-do-jongo/

O Grupo Cultural Jongo da Serrinha nasce então para articular ações continuadas de salvaguarda, educação, arte, cultura e cidadania, preservando e divulgando essa rica manifestação da cultura afro-brasileira. Tia Maria, que era jongueira desde berço — sua mãe cantava os pontos e cantigas desde menina — foi chamada para assumir a direção do grupo, e desde o fim dos anos 1970, se tornou a principal guardiã do Jongo da Serrinha.

Foram anos de lutas para preservação da associação. Desde 2015 o Jongo da Serrinha conquistou uma sede ampla, com 1700m², na Rua Compositor Silas de Oliveira; e hoje é uma ONG coordenada por mulheres, em sua maioria negras, envolvendo diretamente centenas de pessoas, entre músicos, dançarinos, gestoras, professores e alunas.

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