O Ateliê do Engenho de Dentro

Ao ser encarregada, em 1946, de trabalhar com a sessão de terapia ocupacional no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, a médica psiquiatra Nise da Silveira instalou de forma pioneira, ateliês de pintura e modelagem. Localizado no bairro do Engenho de Dentro, a tradicional instituição psiquiátrica ainda utilizava métodos reprováveis por parte de Nise, que viu na arte um caminho terapêutico efetivo nos tratamentos dos pacientes. 

Nise da Silveira. Centro Cultural da Saúde/Ministério da Saúde

Sua iniciativa foi responsável por um debate intenso no meio das artes locais, como a polêmica entre Mário Pedrosa e Quirino Campofiorito através dos jornais cariocas: o primeiro situando os trabalhos feitos no Engenho de Dentro por nomes como Fernando Diniz, Emygdio, Adelina, Isacc e tantos outros pacientes do Setor de Terapia Ocupacional e Reabilitação como arte e o segundo recusando a inclusão dos mesmos nesta categoria. 

Raphael Domingues, Sem título (1949) [Museu de Imagens do Inconsciente] Blog IMS

Outro impacto dos ateliês no Engenho de Dentro no meio artístico carioca eram as colaborações de jovens artistas como professores. Os cariocas Almir Mavigner e Ivan Serpa, além de Abraham Palatnik – todos envolvidos nos anos seguintes com o Grupo Frente – foram alguns dos que se envolveram com a ideia de Nise da Silveira ainda nos primeiros momentos. Ainda em 1946, apenas três meses depois de abertos os cursos, foi realizada uma exposição no local que, no ano seguinte, teve desdobramentos em outras mostras no Ministério da Educação e no Museu Nacional de Belas Artes. Em novembro de 1949 a Câmara Municipal, presidida então pelo médico e poeta Jorge de Lima, traz para o Rio de Janeiro os 149 trabalhos da mostra Nove Artistas de Engenho de Dentro, exibida no Museu de Arte Moderna de São Paulo. 

Nise da Silveira com seus pacientes-artistas no ateliê do Engenho de Dentro. Arquivo Nise da Silveira – Blog da editora Boitempo

Em 1952 Nise da Silveira criou o Museu da Imagem do Inconsciente, também localizado no próprio complexo do Hospital Pedro II. Com o intuito de abrigar as centenas de obras que foram produzidas ao longo das décadas, o Museu existe até hoje, ainda seguindo a ideia de “museu vivo”, em que artistas e acervos convivem no mesmo espaço. A contribuição dos trabalhos feitos pelos ateliês do Engenho de Dentro e pelas pesquisas de Nise da Silveira foram fundamentais para a arte brasileira da década de 1950. Incorporadas no debate crítico e nas instituições que pautavam o debate contemporâneo no país de então, elas funcionaram como um contraponto expressivo ao discurso racionalista que o movimento concreto representava naquele período.

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