Livrarias e editoras
Durante muito tempo, o papel das livrarias na formação da vida literária carioca foi fundamental. Muitas vezes, elas eram, ao mesmo tempo, espaço de encontro, de venda de livros e de edição de autores inéditos. Sem o trabalho de livreiros apaixonados pelo ofício, a literatura brasileira que circulava no Rio de Janeiro teria outros caminhos.
Em 25 de março de 1812, a Gazeta do Rio de Janeiro já anunciava a venda de livros. Na loja de Paulo Martin podia ser encontrada a novela intitulada Filosofa do amor, ou Cartas de dois amantes apaixonados e virtuosos.
A autoria não era o mais importante do anúncio que aparecia em meio a informações de embarcações e demais assuntos gerais. Em 1820, pesquisadores como Ubiratan Machado indicavam que o Rio de Janeiro tinha apenas quatro livrarias – ou melhor, espécies de armazéns que, em meio a toda sorte de produtos, também vendiam livros.
Anos depois, porém, a cidade já triplicava o número de estabelecimentos, mostrando que, mesmo com um público escasso, o hábito da leitura começava a alimentar um comércio.
A primeira casa que pode ser chamada de livraria como conhecemos hoje é a de Louis Mongie, que funcionava na rua do Ouvidor, entre os anos de 1832 e 1853. A presença majoritariamente francesa no mercado de livros da cidade já era evidente nos nomes de estabelecimentos como Cremière, Laemmert ou Villeneuve.
Após a bem-sucedida experiência carioca dos estabelecimentos de Paula Brito, misto de gráfica, editora e livraria, o estabelecimento que seguiu como um espaço de sociabilidade e publicação, além de referência comercial da época, foi a também francesa Livraria Garnier, fundada por Baptiste Louis Garnier em 1844.
Instalada no coração da mítica rua do Ouvidor, como a de Mongie, ela foi a primeira a ter uma vitrine e poltronas nas calçadas para as conversas dos clientes. A Garnier foi a casa da maioria dos escritores e aspirantes de letras da corte carioca, sendo pioneira no pagamento de dez por cento em direitos autorais e na publicação de autores brasileiros de fama. José de Alencar e Machado de Assis foram ligados à Garnier até o fim de suas vidas. Sua editora também aumentou a qualidade do meio editorial brasileiro, ao mandar imprimir na França a maioria de seus livros (inclusive os brasileiros), escapando dos muitos problemas técnicos que a impressão local ainda trazia.
Com o crescimento do meio literário e da imprensa durante o período republicano, novas livrarias e editoras foram se firmando no cenário carioca. Duas das principais foram a Francisco Alves, fundada em 1854 e com longa história, e a José Olympio, fundada em 1931 em São Paulo e transferida definitivamente para o Rio de Janeiro em 1934.
Além de ter sido uma casa editorial de muito sucesso – a maior do país nas décadas de 1940 e 1950, publicando quase 90% dos autores nacionais – seu espaço no número 110 da rua do Ouvidor era, como as antigas Mongie e Garnier, o principal ponto de encontro de autores novatos e consagrados, como José Lins do Rego, Carlos Drummond de Andrade, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos, Jorge Amado e Guimarães Rosa, muitos deles publicados pela própria editora de José Olympio.
Na década de 1960, a editora carioca que assumiu o lugar de principal casa dos autores brasileiros foi a Civilização Brasileira, de Ênio Silveira. Conectado às transformações políticas que vinham ocorrendo na América Latina e no mundo naquele período, o catálogo da editora traduzia livros fundamentais do pensamento crítico ocidental e, ao mesmo tempo, lançava diversos autores nacionais.
Outra editora carioca de grande importância nesse período foi a Zahar, fundada em 1956, pelos irmãos Lucien, Ernesto e Jorge Zahar. Há ainda as experiências locais, como a Editora Sabiá, criada em 1966 e dirigida pelos amigos e escritores Rubem Braga e Fernando Sabino. Antes, ela se chamava Editora do Autor, mas um problema com o sócio Walter Costa fez os dois escritores abrirem com novo nome.
Na década de 1970, as casas editoriais não mudaram muito, mas novas livrarias se tornaram referência na cidade. Uma foi a Leonardo da Vinci, inaugurada em 1952, vendendo apenas títulos em francês. Ao começar a comercializar também títulos nacionais durante a década seguinte, a livraria, então localizada no subsolo do edifício Marquês do Herval, na avenida Rio Branco, se tornou ponto obrigatório de leitores.
Outra livraria que deixou marcada sua história nessa época de sufocos políticos foi a Muro. Localizada também em um subsolo – porém de um edifício na praça General Osório, em Ipanema – a livraria de Rui Campos foi inaugurada em 1975 e abrigou uma série de lançamentos de livros e eventos ligados à geração de poetas chamada geração marginal e grupos como Nuvem Cigana. Posteriormente, os mesmos proprietários abriram a livraria Dazibao e, nos anos seguintes, a Livraria da Travessa.
No século XXI, as transformações tecnológicas ligadas à impressão e edição de livros, ampliou o número de editoras independentes que fazem trabalhos importantes, como a Dantes, cujos trabalhos se iniciaram com um sebo no Leblon; a Sete Letras, que também é uma livraria e foi responsável pela renovação da cena poética carioca dos anos 2000; e a Folha Seca, localizada no centro da cidade e especializada em história e cultura do Rio de Janeiro.