Estátua de Dorival Caymmi
“Quem não gosta do samba bom sujeito não é / Ou é ruim da cabeça ou doente do pé”. Autor de um dos versos mais definidores da nossa música popular, Dorival Caymmi também inventou um gênero musical — a canção praiana —, influenciando até hoje artistas que se tornaram ícones da nossa música.
Caymmi foi um dos maiores nomes da “Era de Ouro” do rádio brasileiro, tanto como cantor quanto como compositor — algo incomum à época. A música de Caymmi influenciou todo um imaginário nacional, ilustrando a vida simples da vida praiana. Aliás, simplicidade e sofisticação são atributos de Caymmi. Nas palavras de seu filho, Danilo, foi “um homem que sabia usar a simplicidade como ninguém”. Ou, como o próprio Dorival escreveu em uma página de sua agenda, segundo confidenciou o próprio Danilo, “Passo a passo, passando, passo” — quase como uma síntese de seu viver.
Dorival Caymmi, aos 80 anos, em seu apartamento, no bairro de Copacabana. Olavo Rufino, 1994. Instituto Antônio Carlos Jobim/Acervo Dorival Caymmi
Caymmi nasceu no ano de 1914, na cidade de Salvador. Apesar de ter exaltado com maestria as belezas da Bahia em suas composições, foi no Rio de Janeiro que Dorival passou a maior parte de sua vida e viu sua música ganhar o mundo. Em 1938, às vésperas de completar 24 anos, embarcou em um Ita (um navio da Companhia Costeira, que fazia transporte de cabotagem pela costa brasileira) e deixou sua cidade natal. Além das roupas, trouxe consigo seu violão.
Em 1939, ano seguinte à sua chegada ao Rio de Janeiro, alcançou o sucesso ao gravar com Carmen Miranda “O que é que a baiana tem?”. A canção fez parte do filme Banana da Terra (1939), estrelado pela cantora. O encontro com Carmen Miranda, aliás, foi arrebatador para ambos — consta que o movimento das mãos e antebraços que tanto definem a apresentação de Carmen foi uma sugestão do próprio Caymmi.
O primeiro endereço no Rio de Janeiro foi numa pensão de estudantes e comerciários na rua São José, no centro da cidade. Logo que chegou, fez um passeio de carro, com um primo, por Copacabana. Ali se apaixonou de vez: amou estar à beira mar, no bairro que lembrava a Bahia, com sua praia, a colônia de pescadores do Posto 6 e as festas de Iemanjá. Morou na rua Souza Lima e, mais tarde, no Edifício Adriano de Barros, localizado na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, nº 198, esquina com a Rua Ronald de Carvalho, em Copacabana, seu lar definitivo.
Em uma entrevista, ao ser perguntado “por que o grande amor por Copacabana?”, respondeu: “Copacabana representa uma porção de coisas importantes, muitas amizades sólidas, sua paisagem é um negócio invulgar, porque tem mistérios que prendem a gente. Tenho paixão pela orla. Porque tem o Posto 6, que eu acho o lugar mais bonito da praia”.
Jornal O Globo, 14 de agosto de 1989.
Dorival Caymmi eternizou seu amor pelo bairro com a canção “Sábado em Copacabana”, com os versos: Depois de trabalhar toda semana/ Meu sábado não vou desperdiçar/ Já fiz o meu programa pra essa noite/ E já sei por onde começar/ Um bom lugar para encontrar/ Copacabana/ Pra passear à beira-mar/ Copacabana/ Depois num bar à meia-luz/ Copacabana”.
A estátua que imortalizou Dorival Caymmi, uma peça de bronze em tamanho real (cerca de 1,80m) e quase 300kg, não poderia estar em outro lugar da cidade. O monumento foi inaugurado no dia 11 de dezembro de 2008, poucos meses após o falecimento do cantor. A peça foi produzida pelo artista plástico carioca Otto Dumovich — autor de outros monumentos espalhados pela cidade, como as estátuas de Braguinha (Copacabana); Cartola (Mangueira) e Pixinguinha (na Travessa do Ouvidor, no Centro).
Caymmi na orla da praia, em 1997. Evandro Teixeira/AJB.
A foto que serviu de base para a criação da estátua, com Dorival caminhando com seu violão no calçadão de Copacabana, na altura do Posto 6, foi tirada pelo grande fotógrafo Evandro Teixeira, no final dos anos 1990. Otto Dumovich estilizou o movimento de Dorival, como quem dá passos alegres, com o corpo ligeiramente inclinado. E a mão esquerda, além do aceno, parece sambar. Mas Otto manteve a escolha de um figurino típico de Dorival: nada de ternos e gravatas, apenas roupas folgadas e confortáveis.
De fato, não havia melhor lugar no Rio de Janeiro para homenagear Dorival Caymmi. Além de ser “o lugar mais bonito da praia”, o Posto 6 também abriga um tradicional agrupamento de pescadores, com os quais Caymmi sempre vinha conversar e comprar peixe fresco. Além dos turistas que sempre param para tirar uma fotografia com a escultura, não é raro que, nos dias de carnaval, músicos e foliões prestem homenagens a um dos baianos que mais abraçou o Rio.