Do Pequeno Rio à Cidade Maravilhosa
Autora: Camilly Ferreira Santos
Ela nasceu em Saracuruna, um pequeno bairro localizado na baixada fluminense, onde moravam seu pai e sua mãe em uma pequena casa em um quintal de aproximadamente 30 metros quadrados comprado pela sua avó por 20 reais e depois dividido para 6 dos seus 7 filhos. Aprendeu desde cedo a aproveitar as pequenas alegrias da vida: lá não havia prédios, praias, parques de diversão e nem grandes comércios, mas se desejava altura, tinha árvores, se desejava banhar-se, tinha rios, se quisesse diversão, havia o pique bandeira, o pique esconde o pique ajuda e mais uns mil piques, sem contar o mercadinho da esquina, caso quisesse fazer compras.
Crescida ao lado de sua família materna e de seus 26 primos, soube aproveitar muito bem o que a infância e a geografia lhe ofereceram. Era um bairro pequeno e distante do centro, mas aquele lugar era o centro da vida dela.
Um pouco mais moça, passou a dar mais atenção às limitações que se impunham sobre sua vida, queria qualidade nos estudos, novos lugares, menos convivência com o que não acrescentava e mais perspectiva de vida, percebeu a criminalidade, as enchentes e o quanto aquela realidade a acuava.
Na busca por melhores oportunidades acadêmicas
conquistou uma bolsa e foi estudar em um curso preparatório em Duque de Caxias. Foi no caminho para esse bairro, aos14 anos, que aprendeu a se locomover para muitos lugares e andar sozinha. O centro de Caxias também era conhecido por seu comércio variado, assim ela ganhou novos gostos e novos hábitos de consumo. Inserida no ambiente do curso teve a oportunidade conhecer outras realidades, outros mundos e possibilidades. Se até aquele momento ela apenas sonhava, agora viu a chance de tornar realidade o que desejava e tudo isso sem deixar de perceber o quanto seus horizontes se expandiam.
Após se dar conta do quanto queria crescer, deparou-se também com o quanto sua realidade não era compatível com suas expectativas, parecia que todas as qualidades perdiam para seus déficits. Por ter saído de uma escola com um baixo nível de qualidade foi um baque para ela ver matérias tão avançadas. Quando chegava em casa, via que aquele ambiente não compactuava mais com o que ela precisava para estudar e se dedicar. Por reconhecer que não tinha o que muitos tinham, ela pode ver que possuía algo pouco comum: era esforçada e reconhecia a utilidade do que possuía, ao invés de enaltecer o que faltava. Aplicando esses dois princípios ela persistiu.
Como consequência de sua dedicação aos estudos, conseguiu passar para o Centro Federal de Educação e Tecnologia, mais conhecido como CEFET/RJ. Nesse novo ambiente, em um contexto que jamais imaginou participar, adotou como filosofia de vida a ideia de que é possível chegar aonde quiser independentemente do seu ponto de partida. Ela visitou bibliotecas, a Lagoa, as praias, trilhas e entrou para um time de Rugby que conheceu através de um projeto da escola. Foi através desse projeto que ela foi convocada pela Federação Fluminense de Rugby para compor a seleção feminina do M18 no campeonato estadual. Fez algumas amizades e verdadeiros irmãos. Desenvolveu muitos projetos. Em um dos seus passeios, no topo da trilha da Pedra Bonita, ela sentiu que o seu sonho não era mais impossível, muito menos utópico: com 17 anos ela finalmente conheceu a Cidade Maravilhosa.
Essa foi a trajetória dela, desde seu pequeno Rio, aquele pequeno mundinho em que nasceu inserida, dentro daquela realidade limitada, aquele mundo que se resumia a Saracuruna, até seu Rio de Janeiro. Mas essa não é nem a metade da história, pois em Saracuruna tinha vontade de conhecer Caxias, em Caxias tinha vontade de conhecer o Rio de Janeiro, e agora, conhecendo o Rio, ela tem vontade de conhecer o mundo. E a mesma coisa que a trouxe até aqui a levará para onde ela quiser, com esforço e conhecimento.