Bar ZiCartola
Foram apenas 20 meses. O suficiente, porém, para que o sobrado da rua da Carioca, número 53, entrasse para a história da música brasileira. O restaurante de Dona Zica e de Cartola, o casal de mangueirenses mais célebre de todos os tempos, abriu as portas em setembro de 1963. Da cozinha, saíam os pratos de comida caseira que ela preparava com esmero — era sonho antigo poder dedicar-se à cozinha. No salão, desdobraram-se noites e noites memoráveis, com a reunião de nomes como Nelson Cavaquinho, Ismael Silva, Zé Kéti, Clementina de Jesus, Ciro Monteiro, Elizeth Cardoso, Aracy de Almeida, Hermínio Bello de Carvalho, João do Vale.
Foi lá, por exemplo, que Paulinho da Viola — que à época ainda atendia por Paulo César Batista de Faria, seu nome original — fez sua primeira apresentação. Foi lá também, que se intensificou a costura entre samba e bossa nova, com intérpretes de um e de outro elaborando uma saudável e alegre interlocução.
Mas a importância do ZiCartola vai muito além da seara musical. Em tempos de Chumbo, a pensão que virou reduto cultural foi também espaço de resistência política. Em suas mesas, forjaram-se as bases de projetos como o do show Opinião. Ou o Rosa de Ouro, dirigido por Hermínio Bello de Carvalho, espetáculo conhecido por ter restituído destaque ao samba. Obras artísticas que conseguiram elaborar, de diferentes formas, algum tipo de postura crítica ao autoritarismo em voga no país.
Em maio de 1965, o ZiCartola fechou as portas, por problemas administrativos — há quem diga que o fechamento foi resultado da pressão dos militares. Hoje, apenas uma placa tímida na rua da Carioca alerta para a importância da antiga pensão.