A polêmica da Estátua Equestre
Por ocasião da comemoração da independência do país em 1822, a estátua equestre de Dom Pedro I, localizada no antigo largo do Rocio – depois chamado Praça da Constituição e, finalmente, Praça Tiradentes – foi o primeiro grande monumento público construído pela corte para marcar por toda a posteridade o evento nacional e seu herói. Sua inauguração, porém, se deu em meio a uma série de polêmicas no quadro político do período. O primeiro a apresentar projeto à Câmara solicitando a construção e a homenagem foi Haddock Lobo (1817-1869), em uma sessão de 7 de setembro de 1854.
O concurso para eleger o desenho vencedor para a realização da estátua ocorreu no âmbito da Academia Imperial de Belas Artes durante o ano de 1855. Seu vencedor foi o secretário da Academia, João Antonio Mafra (1823-1908), brasileiro, porém o projeto foi posto em prática pelo escultor francês Louis Rochet, terceiro colocado no concurso original. As esculturas de bronze foram feitas e fundidas em Paris, fazendo do monumento nacional uma obra multinacional.
A inauguração foi marcada para o dia 30 de março de 1862. O seu local, porém, foi a base de uma intensa polêmica. O largo do Rocio era não só um local de aglomeração e revoltas populares, como foi também o sítio em que Tiradentes foi enforcado. Essa memória insurgente de um movimento que foi contrário à Monarquia e a dinastia dos Bragança, se tornou um símbolo para os liberais e republicanos. No dia de sua inauguração, panfletos contrários à estátua foram distribuídos e o líder da revolta de 1842, Teófilo Otoni, chamou publicamente a obra de “mentira de bronze”.
A estátua de 3,3 metros, que mostra um Pedro I sobre seu cavalo, portando a carta da Constituição em uma das mãos, suspenso por uma base que reproduz quatro dos principais rios brasileiros (Amazonas, Madeira, São Francisco e Paraná) a partir de figuras indígenas e animais como antas e tamanduás, mostrou como a sociedade carioca já era mobilizada por debates estéticos que envolviam suas aspirações políticas. Apesar das polêmicas, sua inauguração foi uma aclamação nacional, com pessoas vindo de outras cidades para assisti-la.
Atualmente, a estátua é vista por artistas de novas gerações como representação do período colonial e imperial, junto ao seu lastro escravocrata. No bojo dos movimentos que repensam o papel de monumentos ligados à exploração racial da escravidão ao redor do mundo, a artista Diambe Silva e um grupo de colaboradores organizou no dia 22 de janeiro de 2020 a ação Devolta, em que peças de roupas rasgadas e embebidas em gasolina foram postas ao redor do monumento e queimadas, criando um círculo de fogo. A ação fugaz marca mais um dos muitos usos e significados políticos que a estátua constituiu na cidade desde sua inauguração em 1862.