Mãe d’água dos cariocas
Mãe d’água, rainha das ondas, sereia do mar.
Mãe d’água, seu canto é bonito quando tem luar.
Ponto de Umbanda em homenagem à Iemanjá
Filha do oceano, a cidade do Rio também tem mãe. A mãe-d’água do rio Carioca, nascente situada na Floresta da Tijuca, alimentava a cidade e em torno de sua presença e de sua história se criou toda uma reverência e muitas lendas. Este local mítico e real, onde foi construída a caixa d’água de captação do rio, tornou-se um marco na história da própria sobrevivência na cidade. Como afirma a historiadora Lorelai Kury, o lugar esteve no centro de algumas das construções simbólicas da nacionalidade, num tempo em que as riquezas naturais da terra fundamentam uma visão de pátria brasileira.
O nome mãe-d’água que lhe foi atribuído não só indica ser o local da matriz do rio que alimentava a cidade, como se relaciona diretamente a um imaginário indígena das criaturas lendárias que habitam as fontes de água doce. Juntaram-se a esta tradição cultural formas africanas de compreender a natureza como sagrada, e as mães das águas salgadas e doces se encontraram, se articularam, e se misturaram. Afinal, mãe-d’água também é sereia.
O rio Carioca foi, durante muito tempo, a principal fonte de água potável da cidade e, além de ser utilizado também para a rega do plantio e a criação de animais, suas fontes, chafarizes e córregos eram espaços das lavadeiras — lugares de trabalho, de encontro e sociabilidade. Os viajantes do século XIX retrataram muitas cenas destas mulheres em atividade.
Houve outros rios importantes no início da história da cidade, como o Maracanã, o Comprido e o Trapicheiros, todos vitais para o Rio de Janeiro existir, sobreviver e crescer. Esses rios, seus afluentes e suas fontes desenharam formas de ocupação da cidade, sobretudo até o fim do século XIX. Na virada do século XX, outras águas foram chamadas para atender a cidade. Os rios Covanca, Mendanha e Piraquara tiveram seus percursos alterados para abastecer o Rio.
Hoje, quase esquecidos, os rios do Rio ainda resistem e seguem, a despeito de tudo, desaguando suas sofridas águas na baía e assim, mantendo-se conectados ao Atlântico. É possível ver sua presença e seus sinais.