O cais do porto no início do Rio
Quem seria capaz de descrever as belezas que apresenta a baía do Rio de Janeiro, esse porto que, na opinião de um dos nossos almirantes mais instruídos, poderia conter todos os navios da Europa?
(Saint-Hilaire, século XVIII)
As enseadas da Baía de Guanabara convidavam os primeiros navegantes ao desembarque, além de ser um local estratégico nos interesses dos portugueses em assenhorear-se das terras mais ao sul daquela costa do que viria a ser o Brasil. Guanabara é uma palavra em língua Tupi-Guarani, que designa “braço de mar” ou “seio de mar” ou ainda “rio-mar”. Seu nome nos lembra os povos indígenas, quem primeiro habitou aquele entorno de águas tranquilas, povoadas por golfinhos e baleias, se arredondando formosamente em praias de pouca areia. A profundidade da água não permitia chegarem embarcações maiores na costa, e para isso eram necessário barcos menores — quase canoas. Essa era a baía que, confundida com a foz de rio — talvez — foi encontrada por caravelas estrangeiras, bem no início do século XVI. O navegante florentino Américo Vespúcio louvou, em 1502, as qualidades do local, qualificando como “terra amena, temperada e sã”.
Em lugar próximo à boca da baía — mas não tanto, para que não deixasse de ser seguro — se criou o cais, numa pequena enseada, na qual foram sendo construídos pontos para atracar as pequenas embarcações. A primeira ocupação pelos portugueses ao redor do que viria a ser o marco fundador da cidade, se deu próximo à praia do Flamengo, mas sua continuidade e expansão enfrentou constante luta contra os indígenas, em grande parte tamoios, que defenderam sua terra como bem caberia fazer. Na batalha de Uruçumirim, em 1567, houve dezenas de mortos e centenas de aldeias indígenas foram incendiadas. Outros grupos indígenas, como os temiminós, se aliaram aos portugueses, na dura disputa por seguir naquela terra.
O porto nasceu marcado por esta história de conflitos. Em frente a esse cais foi erigido um convento carmelita, no século XVII. E, mais tarde, na primeira metade do século XVIII, a sede da Capitania do Rio de Janeiro, que veio a se tornar o Paço Imperial — símbolo do poder colonial. Neste lugar desembarcavam pessoas e mercadorias na cidade que se tornou capital da América Portuguesa em meados do século XVIII. Não era o único cais de desembarque, havia outras praias, como a dos mineiros, onde chegavam para receber suas encomendas aqueles vindos das Minas Gerais, também naquele século. São Sebastião do Rio de Janeiro: cidade-mar, marcadamente negra neste tempo de tão intensas conexões atlânticas, mas com uma história de longa presença e lutas indígenas em suas margens.