Na Maré como em África
Assim como em diversos territórios do Brasil, a presença negra é muito marcante na história da Maré, e se mostra através das diversas manifestações religiosas, sotaques, danças, ritmos e na resistência de se reinventar no território.
Se até o século XIX a presença africana e afrodescendente se dava majoritariamente pelo cativeiro — nas fazendas da Baixada de Irajá e da microbaía de Inhaúma — ou pela existência do quilombo do Vai e Volt, onde hoje é a Penha, a partir do século XX essa presença adquiriu novos sentidos.
A partir dos anos 1990, alguns imigrantes africanos se juntaram às levas de migrantes nordestinos que chegaram à Maré desde os anos 1940. Ainda que não seja um quantitativo alto de pessoas, esse novo fluxo de africanos que têm adotado a Maré como local de moradia contribui de diversas formas para aprofundar as complexidades que o território possui em cores, sotaques, origens e hábitos.
Muitas dessas pessoas vêm de países que viveram processos recentes de guerras civis e crises econômicas, como Congo, Senegal, Gana e Angola. Alguns desses imigrantes — como os angolanos —, encontram no Brasil a facilidade da língua portuguesa.
É o caso de Nzaje Vieira Dias (Nizaj), um jovem artista angolano morador da Salsa e Merengue — uma das favelas mais novas da Maré. Ele é frequentador de um dos pontos de encontro das colônias africanas no Rio, entre a Vila do Pinheiro e Salsa e Merengue, onde bares e restaurantes de culinária africana estão localizados. Em seus RAPs, Nizaj fala sobre ser um estrangeiro vivendo na Maré, lugar onde se tornou “cria”.
De acordo com o Registro Nacional de Estrangeiros (RNE), em 2016 os angolanos que viviam no Rio de Janeiro representavam 11,5% de todas as pessoas com essa nacionalidade residentes no Brasil. Desses, muitos se estabeleceram na Maré pelas mesmas razões que as levas anteriores: oferta de trabalho próxima, serviços como escolas, custo de vida mais baixo e a solidariedade entre vizinhos — tanto seus conterrâneos do continente africano quanto aqueles que, por possuir histórias familiares semelhantes, demonstram empatia com aqueles que saíram de sua terra natal para tentar uma vida melhor para si e para seus filhos.
Esses imigrantes e seus filhos, a despeito do preconceito e do racismo que enfrentam, têm conseguido se estabelecer no país e fincar novas raízes. Trazendo uma África mais próxima na história e na identidade, tornam-se mareenses de vivência, de identidades forjadas nos sonhos e na esperança de uma vida melhor.