A arte e a corte de Pedro II
Ocorrendo basicamente no âmbito da Academia Imperial de Belas Artes, a vida artística durante o período de reinado de Dom Pedro II ganhou importância capital no cotidiano artístico do Rio de Janeiro. Desde a década de 1830, a pintura, a escultura e os demais ofícios ligados ao universo tradicional das artes passam a conviver na cidade com constantes visitas de artistas europeus – tanto amadores como profissionais – que registram em grande volume aquarelas e telas com a paisagem e os costumes da sociedade carioca. Passam também a conviver com a invenção do daguerrótipo, primeira tecnologia de fotografia até então. Com o entusiasmo de Pedro II, que adquiriu seu primeiro aparelho ainda com catorze anos, alemães, franceses e norte-americanos começam a abrir estúdios com a nova forma maquínica de imagem – é o caso de F. N. Bautz e da dupla Augustus Morand e Smith.
Outro momento importante que abriu ainda mais a circulação de novidades em nosso meio artístico foi a criação, por parte do então diretor da Academia Imperial de Belas Artes, Félix-Emilie Taunay, do prêmio de viagem à Europa. Realizando anualmente desde 1841 a Exposição Geral de Belas Artes, Taunay incluí como premiação a partir de 1845 a viagem que inicialmente era de três anos na França. Mais tarde, o período seria acrescido de mais dois anos de residência na Itália. Essa longa temporada, porém, era controlada rigidamente por uma série de protocolos, obrigações acadêmicas por parte dos pintores e cartas frequentes aos diretores da Academia relatando sua estadia e estudos. Telas históricas, como “A Primeira Missa” (1859-1861), de Victor Meirelles, são frutos desses prêmios.
Em fevereiro de 1849, um ainda jovem e desconhecido aspirante a pintor, Edouard Manet, passa três meses no Rio de Janeiro, aportando na cidade como aprendiz de marinheiro no navio escola Havre e Guadaloupe. Manet, que viria a ser um dos maiores nomes da arte moderna de todos os tempos, não pintou a cidade, mas registrou em cartas e textos futuros o impacto sofrido com a luz da Baía de Guanabara e os tipos sociais que viu – além de desenvolver uma repulsa ao sistema escravagista.
Essa passagem de Manet pelo Rio de Janeiro como um ainda completo desconhecido (ele nem havia iniciado seus estudos de pintura), é de certa forma uma ironia com o que ocorria na cidade: virada para a França, enviava para lá ano após ano uma série de artistas cuja meta era o aprimoramento na cópia dos clássicos e o aprofundamento das maneiras acadêmicas. Apenas dez anos depois de sua visita ao Brasil e do seu impacto com nossa luz, Manet inicia sua trajetória de pintor que, justamente, buscará superar a ideia de arte que brasileiros eram obrigados a reproduzir.
A força da corte também pautava os pintores e escultores que trabalhavam ao redor de encomendas oficiais ou pintavam temas afins com o interesse de um projeto de nação que era desenvolvido durante o auge do Segundo Reinado. Como capital do Império, o Rio de Janeiro era o celeiro principal de tais carreiras oficiais. O principal momento em que isso ocorre é quando, em 1872, João Alfredo Correia de Oliveira, ministro do Império, contrata dois dos mais promissores pintores brasileiros – Vitor Meirelles e Pedro Américo – para realizarem uma série de pinturas históricas com batalhas que marcaram a história oficial do Império. Meirelles ficou responsável pelas telas “Combate Naval no Riachuelo” e “Passagem do Humaitá”, enquanto Américo pintou a “Batalha de Campo Grande”.
Após receberem pelas primeiras pinturas a comenda imperial da Ordem da Rosa, são novamente convocados para mais dois trabalhos. Pedro Américo é convidado a pintar a Batalha dos Guararapes, porém prefere outra, a Batalha do Avaí. Assim, Meirelles fica com o tema pernambucano. Ambos se esmeram em seus trabalhos – o primeiro a realizando em um ateliê em Florença e o segundo fazendo imersões constantes na região retratada – e expõe seus resultados majestosos (a tela de Pedro Américo é a maior já feita no país até então) na Exposição Geral de Belas Artes em 1879. Com um público quase trinta mil pessoas para conferirem os trabalhos, as telas geraram muitas polêmicas em jornais e ruas da cidade, naquilo que ficou conhecida como a questão artística.
Outro ponto a se destacar na vida artística da cidade é o surgimento de um novo campo profissional para desenhistas e artistas gráficos através das primeiras revistas ilustradas. Em 1860 Henrique Fluss começa a publicação da Semana Ilustrada, cujos personagens desenhados marcam época no Império. Em 1868, o desenhista italiano Angelo Agostini funda A Vida Fluminense, onde exerceria seu talento de caricaturista mais famoso daquele período e pioneiro das histórias em quadrinhos no país. Ele também colaborou em outras publicações ilustradas que surgiam na cidade, como O Mosquito e Comédia Social (ambos de 1870), além da Revista Ilustrada, que ajudou a fundar em 1876.