Serras isoladas

As serras isoladas do Rio de Janeiro compõem um conjunto de elevações residuais que rompem a continuidade das planícies sedimentares das baixadas cariocas. São corpos rochosos menores em extensão e altitude quando comparados aos grandes maciços da cidade, mas carregam em sua morfologia e composição geológica significados profundos sobre a história geotectônica e o modelado do relevo carioca.

Estas serras são formadas, predominantemente, por rochas cristalinas de um embasamento de 600 milhões de anos, resistentes à erosão e preservados como testemunhos de relevos. Elas se destacam por estarem parcialmente isoladas dos grandes maciços, como o da Pedra Branca, Tijuca e o Gericinó-Mendanha, revelando alinhamentos interessantes e belos de um relevo que, outrora contínuo, foi desarticulado pela erosão diferencial ao longo de milhões de anos.

Sequência de pequenos alinhamentos serranos isolados na baixada oeste do município: Serra da Capoeira Grande, Serra de Inhoaíba, Serra da Paciência, entre Sepetiba e Campo Grande. Ao fundo a silhueta do Maciço Gericinó-Mendanha

A Serra de Inhoaíba, é a maior delas na Zona Oeste e com altitudes que não ultrapassam os 300 metros, ergue-se como um bloco alongado e estreito que acompanha a direção NE-SW, indicando forte controle estrutural. Suas encostas íngremes e cristas pouco arredondadas sugerem resistência litológica significativa, enquanto os solos argilosos derivados da alteração de gnaisses servem de base para formações secundárias de Mata Atlântica, mesmo em meio à pressão urbana crescente.

Acompanham essa formação as Serras da Capoeira Grande e Paciência, com as mesmas conformações.

Serra de Inhoaíba

Ocupação urbana da baixada entre as Serras da Paciência e a Serra de Inhoaíba. Ao fundo a ponta da Serra de Guaratiba no mar, em Barra de Guaratiba

A Serra da Capoeira Grande, apresenta feições semelhantes: trata-se de uma elevação com altitudes entre 250 e 350 metros, também embasada por terrenos cristalinos. Sua posição relativamente isolada e a presença de blocos graníticos expostos desenham feições testemunhas que deixaram apenas os segmentos mais resistentes do embasamento. Apesar da urbanização fragmentada ao seu redor, a serra ainda abriga remanescentes florestais importantes para a conectividade ecológica da zona oeste, todos protegidos pelo Parque Municipal.

Planície do rio Cação Vermelho, em pleno processo de expansão urbana, ao longo do Ramal Santa Cruz da linha do trem, entre as Serras da Paciência e Inhoaíba. Ao fundo as elevações do Maciço da Pedra Branca

Serra da Paciência, com o bairro Conjunto Urucânia em seu sopé. Ao fundo, o Maciço Gericinó Mendanha

Serra da Capoeira Grande, com o bairro de Jardim Cinco Marias e Pedra de Guaratiba

Da mesma forma, mais a norte, a Serra da Paciência, entre Santa Cruz e Campo Grande, aparece como uma pequena cordilheira esparsa, de perfil arredondado e altitudes modestas. Suas formas suaves contrastam com a rigidez geológica de seu embasamento, e sua conservação atual garante, também, pequenos fragmentos florestais de Mata Atlântica secundária. A paisagem que a envolve — composta por baixios alagadiços e antigas várzeas de rios — reforça seu papel como enclave cristalino em um domínio predominantemente sedimentar.

Na porção leste do município, acompanhando o alinhamento norte do Maciço da Tijuca jaz a conhecida Serra da Misericórdia, contornando os bairros de Madureira, Cascadura, Inhaúma até Olaria e Penha. Constitui uma elevação isolada do embasamento cristalino, formada predominantemente por gnaisses bandados, semelhantes aos que estruturam o Maciço da Tijuca, ao qual se encontra geologicamente próxima. Com altitudes modestas, geralmente abaixo dos 200 metros, essa serra se destaca não pela imponência física, mas por sua expressiva presença simbólica na paisagem urbana carioca. Estão nela, grandes pedreiras que alimentaram o crescimento da cidade, um dos maiores complexos de favelas do município e a preciosa Igreja de Nossa Senhora da Penha, erguida sobre um dos mais imponentes afloramentos rochosos e visível a grandes distâncias.

Geologicamente, a Serra da Misericórdia representa um fragmento do embasamento do maciço que resistiu à erosão e à urbanização, mantendo-se como testemunho de uma superfície antiga que foi parcialmente rebaixada pelas oscilações tectônicas e pela ação dos agentes externos. Suas encostas revelam a estrutura interna dos gnaisses, com dobras, lineações e planos de foliação que orientam o escoamento das águas pluviais e condicionam processos de instabilidade em áreas de ocupação.

A Penha, Penedo ou Pedra, afloramento rochoso sobre a qual repousa a Igreja de Nossa Senhora da Penha, no bairro da Penha.

Ainda que de dimensão modesta, a serra guarda remanescentes de vegetação nativa, fragmentada e pressionada, mas resiliente. Sua posição estratégica entre bairros densamente urbanizados a torna um ponto de resistência ecológica e de memória geográfica, conectando o sagrado, o geológico e o urbano num único corpo que se eleva sobre a cidade.

Essas serras isoladas, apesar de suas dimensões reduzidas, são peças fundamentais para compreender o mosaico geológico do Rio de Janeiro. Funcionam como marcos territoriais, corredores ecológicos, e como arquivos litológicos que revelam os contrastes entre as fases de soerguimento e rebaixamento do relevo ao longo da história geológica da cidade. Elas também desafiam os padrões urbanos, impondo limites físicos e abrindo possibilidades de resistência ecológica no interior do tecido metropolitano.

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