Passeando pelas ruas do centro da cidade nas primeiras décadas do século XX, podíamos avistar os edifícios de muitos dos jornais ali instalados. Vamos então rememorar alguns deles, que encontramos entre as fotos do arquivo da Light. A Imprensa (esquina à direita) era propriedade da Sociedade Anônima Progresso e foi fundado por Alcindo Guanabara. Antes desse, no século XIX, houve publicação homônima de Rui Barbosa. Quando A Imprensa mudou-se para ali, deixou o endereço anterior para um jornal que estava sendo fundado e que viria a se tornar um dos mais importantes da cidade e do país, O Correio da Manhã. Em seu expediente, declarava dois endereços: avenida Central 155 e rua da Assembleia 95, onde estavam a administração, a redação e as oficinas. Encerrou as atividades em 1919. Do outro lado da rua (esquina à esquerda) ficava o cinema Avenida, ocupando os números 151/153 da avenida onde era uma das principais atrações. Bem ali naquele cruzamento com a rua da Assembleia, passavam os bondes que vinham da praça XV e seguiam pela rua da Carioca até a praça Tiradentes, Campo de Santana e adiante.
Em outra esquina da avenida Central (números 120, 130, 132) ficava a sede de O Paiz, “jornal independente, político, literário e noticioso,” fundado em 1884. Era um dos mais influentes por ocasião das campanhas pela abolição da escravidão e proclamação da República. Seu primeiro redator-chefe foi Rui Barbosa, logo substituído por Quintino Bocaiúva, um dos fundadores do Partido Republicano e que teve uma passagem mais longa naquela função, até 1901. Mudou-se para o novo edifício, na esquina com a rua Sete de Setembro, logo após a abertura da avenida Central. O Paiz durou meio século, passando a ser combatido a partir da Revolução de 1930 e fechando em 1934. Outros jornais vieram em seguida para a nova avenida; o Jornal do Brasil inaugurou sua nova sede, ali perto, em 1909.
Neste detalhe, cruzando a avenida Central entre os transeuntes, o destaque é para as duas mulheres que caminham na direção do fotógrafo. Provavelmente usavam espartilhos sob aqueles vestidos longos, que as obrigava a segurá-los com as mãos para que não arrastassem no solo ou as fizessem tropeçar. Os chapéus com adornos vistosos eram modelos ‘viúva alegre’, uma referência à montagem teatral da opereta homônima e que tornou-se uma tendência da moda naquele início de século.
O jornal A Noite foi fundado em 1911 por um grupo onde destacava-se Irineu Marinho, ex-secretário geral da Gazeta de Notícias; sua redação estava instalada em um sobrado no largo da Carioca 14; as oficinas, na rua Julio Cesar (Carmo) 31. Foi o primeiro vespertino do Rio de Janeiro – consoante com seu nome, era lançado por volta das 19h trazendo notícias coletadas até as 17h30min. A título de exemplo, transcrevemos a nota publicada à esquerda do título do jornal em 20 jul. 1911: “Hoje. Notas úteis. A princípio nublado, ameaçando chuva, tornou-se depois muito bonito o dia de hoje. A tarde foi esplêndida e quente. A temperatura máxima foi de 24o,6; a mínima de 19o.” Era um jornal popular; chegou a tirar duzentos mil exemplares diários a um preço módico em sucessivas tiragens ou ‘clichês’, como se dizia, atualizando notícias inclusive na célebre página intitulada “Última Hora”, que dava espaço de destaque aos crimes e casos policiais, além da política: “Últimos telegramas dos correspondentes especiais da ‘A Noite’ no interior e no exterior e serviço da Agência Americana. Últimas informações rápidas e minuciosas de toda a reportagem da ‘A Noite’.” No jornal havia espaço, ainda, para o folhetim; nele Lima Barreto publicou o romance satírico “Numa e a Ninfa”.
Foi o jornalista Jota Efegê quem resgatou esta história: em 1913, quando o chefe de polícia do Rio de Janeiro Belisário Távora (que reprimia o jogo e a prostituição) declarou que “o jogo estava liberado enquanto o governo não se pronunciasse”, uma dupla de repórteres daquele jornal instalou uma roleta ali mesmo, no Largo da Carioca – e acabaram presos. Anos depois, em 1916, o episódio inspirou o primeiro samba a ser gravado, Pelo Telefone – registrado por Donga no Escritório de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional e logo executado publicamente: “O chefe da polícia pelo telefone manda me avisar / Que na Carioca tem uma roleta para se jogar...”
O jornal teve várias fases. Em 1925 Irineu Marinho afastou-se após episódio conturbado que levou-o a criar O Globo. Em 1929, agora propriedade de Geraldo Rocha e sob a direção de Diniz Júnior, foi inaugurada a nova sede do jornal no célebre edifício A Noite, projetado pelo arquiteto francês Joseph Gire, o mesmo que projetou o Palácio das Laranjeiras, o Hotel Glória e o Copacabana Palace Hotel. Com 23 andares, era o edifício mais alto da América do Sul. Foi adquirido novo maquinário gráfico e o projeto editorial passou por renovação; em 1930 foi lançado o lendário suplemento semanal ilustrado, impresso em rotogravura. Esse edifício é dos mais marcantes na história da cidade. Ali funcionou a Rádio Nacional, inaugurada em 1936. O jornal A Noite passou tempos difíceis e circulou até 1964.