Picaretaço
Em novembro de 1986, o governo do presidente José Sarney anunciou o Plano Cruzado II, que determinou o fim do congelamento dos preços de produtos de necessidade básica (decretado em fevereiro daquele ano). A medida foi a confirmação de mais um fracasso na lista de tentativas da equipe econômica em conter os altos índices da hiperinflação, herança dos tempos da Ditadura Militar. Em março de 1987, o aumento no preço nos aluguéis gerou mais descontentamento na população. E os movimentos sociais demonstravam seu repúdio à maneira como o presidente conduzia a crise em novas ondas de protestos, cada vez mais violentos.
No dia 25 de junho, durante uma visita oficial ao Rio de Janeiro, o presidente foi hostilizado por manifestantes aos gritos de “Fora, Sarney!”, na porta da Academia Brasileira de Letras (ABL). Em seguida, no Paço Imperial, ao término de outra solenidade, o ônibus que transportava a comitiva presidencial foi cercado e depredado.
Uma picareta arremessada na direção do banco onde o presidente estava sentado estilhaçou a janela, e ele sofreu um ferimento na mão. Jorge Murad, seu secretário particular, teve o rosto atingido por cacos de vidro. Antônio Martins, presidente da Radiobrás, levou um corte na testa. Também estavam no veículo o governador do Rio de Janeiro, Moreira Franco, ministros de Estado e outas autoridades civis e militares. A equipe do governo deixou o local com escolta armada.
Batedores do Exército e camburões da Polícia Militar com sirenes ligadas liberaram o trânsito, avançando sobre a manifestação, enquanto os carros estacionados nas imediações eram apedrejados. O episódio, que ficou conhecido como Picaretaço do Paço Imperial, reuniu aproximadamente duas mil pessoas. O tumulto em que a segurança física do presidente da República foi colocada em risco estampou a crise vivida no país. O Rio de Janeiro permaneceu em pé de guerra durante praticamente todo o ano de 1987.
Esse texto foi elaborado pelo pesquisador Bruno Viveiros Martins do Projeto República (UFMG).