Estátua de Noel Rosa
Noel de Medeiros Rosa viveu apenas 26 anos, mas sua obra e importância para o imaginário carioca foi tamanha que esse tempo de vida parece ter sido outro, muito maior. Com mais de 250 canções escritas, Noel Rosa mudou para sempre os caminhos do samba urbano carioca — que à época, nos anos 1920 e 30, passava por transformações significativas, principalmente pela inserção desse gênero na emergente indústria cultural do período.
Noel e seu violão. Fundação Biblioteca Nacional
Noel Rosa é um símbolo para o Rio de Janeiro, e mais ainda para o bairro de Vila Isabel. Nasceu em 1910 e até o fim de sua vida — encurtada pela tuberculose que o vitimou ainda moço —, viveu num único endereço, na rua Teodoro de Silva, n. 30. A casa não existe mais, mas no local (atual n.392) há um prédio que leva o nome de Noel Rosa.
Casa onde nasceu Noel Rosa, na Teodoro de Silva, n. 30. Arquivo Nacional
Não é à toa que os moradores de Vila Isabel cultuam tanto a memória de Noel Rosa. O “poeta da Vila” cantou o bairro em suas composições, sendo a mais notória delas “Feitiço da Vila” — escrita à quatro mãos com Vadico —, com seus icônicos versos em homenagem à Vila Isabel, onde “quem é bacharel/ não tem medo de bamba”. E, nos tempos da Primeira República — quando a presidência se alternava entre Minas Gerais e São Paulo —, o Rio tinha algo a mais a oferecer: “São Paulo dá café/ Minas dá leite/ E a Vila Isabel dá samba”.
Dado o carinho do compositor pelo bairro e pela memória afetiva que seus moradores criaram por Noel, não havia lugar melhor para alocar uma estátua em sua homenagem. E mais: a escolha da maneira como Noel Rosa foi representado também foi mais do que apropriada. Afinal, falar de Noel Rosa é falar dos sambas consagrados, das rivalidades com outros compositores e, claro, de boêmia. Noel era frequentador assíduo de botequins, onde imaginou e escreveu grande parte de suas obras. E nas mesas de bar, entre amigos e amantes, os garçons eram companheiros deste ambiente de trabalho.
Carteira de identidade de Noel Rosa, datada de 1935. Fundação Biblioteca Nacional
Uma canção ilustra perfeitamente essa sinergia do músico com o bares da Vila: “Conversa de Botequim”. Foi justamente esse clássico do cancioneiro nacional, que serviu de inspiração para a estátua em homenagem ao compositor. O monumento ilustra uma cena que certamente se repetiu muitas vezes: O músico sentado à mesa de forma relaxada, bebendo e fumando enquanto recebe o atendimento do garçom. A cadeira vazia está à disposição para quem passar por ali se juntar a Noel em uma conversa de botequim. Inaugurada em 1996, a obra é pioneira, considerada o primeiro monumento interativo do Rio de Janeiro.
A “moldura” do monumento é composta por quatro portas estilizadas em granito e ferro. O artista paraibano Joás Pereira Passos — autor de outros monumentos conhecidos do Rio, como o de Luiz Gonzaga em São Cristóvão e Getúlio Vargas na Glória —, declarou que fez a estátua “como se ele [Noel] estivesse compondo com uma caixinha de fósforo”.
Foto: Beth Santos/Prefeitura do Rio
A peça foi alvo de furto e vandalismo diversas vezes. Mesmo com ações de restauro pela Prefeitura, partes do monumento continuaram a ser roubadas: o copo de cerveja, o apoio da cadeira e até mesmo o garçom, dos quais sobraram apenas algumas partes das pernas e os pés. O monumento foi desaparecendo gradualmente, até que, em 2019 a estátua foi removida e guardada em um depósito, restando um vazio na praça do Largo do Maracanã. Mas a população do bairro se mobilizou para o retorno do monumento, e em 2021, no aniversário de 111 anos do artista, no dia 10 de dezembro, o Noel Rosa de bronze voltou para a praça, onde aguarda a próxima companhia para uma boa conversa de botequim.