Estátua de Luiz Gonzaga – Centro de Tradições Nordestinas
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Um homem de sorriso largo, tocando sanfona, usando um gibão vistoso, sandálias de couro e um chapéu à moda dos cangaceiros, todo enfeitado. Se fosse um jogo de adivinha, a resposta óbvia para a pergunta “quem é essa pessoa?” seria: Luiz Gonzaga. E não é para menos: um dos artistas mais icônicos da canção brasileira, Gonzagão fundiu e criou estilos musicais, simbolizou a cultura de milhões de brasileiros — em especial, do Nordeste — e se tornou o Rei do Baião.
“Predestinado” a correr mundo e conquistar multidões — de acordo com uma cigana que teria lido o destino de Luiz antes mesmo de completar um ano —, Luiz Gonzaga do Nascimento, nasceu em Exu, Pernambuco, em 13 de dezembro de 1912. Aos 12, o menino já acompanhava o pai em festas e sambas pelo sertão do Araripe, onde fica Exu. Aos 18 anos fugiu de casa e se alistou no Exército, seguindo a carreira militar por quase uma década. Serviu no Ceará e Minas Gerais. Após dar baixa, foi para o Rio de Janeiro, em 1939. Após 10 anos sem dar notícias para a família, Luiz Gonzaga partiria de navio para Pernambuco. Enquanto aguardava a data de partida da embarcação, ficou no Batalhão de Guardas do Rio de Janeiro. Ali conheceu o ex-marinheiro e violonista Xavier Pinheiro, que o aconselhou a se apresentar em programas de rádio para conseguir dinheiro. Tudo mudaria a partir de então.
Luiz Gonzaga (à direita, com a sanfona) ao lado de Norival Guimarães (com o violão), ainda vestido com terno e sapato de verniz. 1946 c. Coleção José Ramos Tinhorão / Instituto Moreira Salles
Gonzagão cunhou uma musicalidade nordestina com o trio “Pé de Serra”, com sanfona, triângulo e zabumba. Com seu vozeirão inconfundível, gravou sucessos como “Asa Branca” e “Baião” (compostas em parceria com Humberto Teixeira); “Xote das meninas” (parceria com Zédantas). Mas para além da música, sacramentou — em etapas, vale destacar — uma referência imagética que se mantém até os dias de hoje. Numa leitura perspicaz, Luiz Gonzaga notou que, enquanto o carioca tinha sua camisa listrada, o baiano chapéu de palha e os sulistas as bombachas, faltava ao sertanejo do Nordeste um adereço que o caracterizasse. Foi quando se lembrou de Lampião e seu chapéu. Num primeiro momento teve o adereço barrado — “cangaceiro na Nacional, não!”, teria ouvido — e o chapéu ficava apenas para as apresentações que fazia na porta do edifício “A Noite”, sede da rádio. Porém, o sucesso de Gonzagão foi tamanho que os executivos da Nacional cederam, e Luiz Gonzaga pôde abrir mão do terno, gravata e sapato de verniz que até então usava, e entrou para a história com seu gibão, sandália de couro e cartucheira no peito. O chapéu de couro ficou maior e ganhou uma coroa no centro. O Rei do Baião, afinal, surgiu em terras cariocas.
Já vestido com Gibão e chapéu de couro à moda cangaceiro. A coroa no centro do chapéu faz jus ao Rei do Baião. S/d – Coleção José Ramos Tinhorão / Instituto Moreira Salles
Luiz Gonzaga, além de ser o maior divulgador da música nordestina Brasil afora, também representou o êxodo de milhares de nordestinos que vieram tentar uma vida melhor no sudeste. Castigada pela seca e pela falta de políticas públicas em meados do século XX, a região nordeste viu muitos de seus “filhos” partirem rumo a São Paulo, Rio de Janeiro e outros estados da parte mais ao sul do mapa.
O Campo de São Cristóvão — onde fica a atual Feira de tradições nordestinas — era o ponto final para os migrantes dessa região do Brasil chegavam, principalmente entre as décadas de 1940 e 1950, que vinham em caminhões “pau de arara”. Lá eram recebidos por conterrâneos, estabelecidos no Rio há mais tempo, que muitas vezes pagavam a passagem do recém-chegado para liberar a bagagem deixada como garantia com o motorista do caminhão.
Marcelo Motta/Wikiloc
Ainda que essa não tenha sido exatamente a maneira como Luiz Gonzaga chegou ao Rio de Janeiro, a implementação de sua estátua nesse mesmo local é bastante simbólica. Feita em bronze e inaugurada em 2003, a estátua em tamanho natural de Luiz Gonzaga, feita pelo artista paraibano Joás Pereira Passos — autor de outros monumentos, como a estátua de Noel Rosa, em Vila Isabel — dá as boas vindas a quem chega na Feira de São Cristóvão pela entrada próxima ao elevado da Linha Vermelha. O mapa do Brasil, aos pés de Gonzagão, parece fazer menção à uma de suas canções, A vida do viajante” (parceria com Hervê Cordovil), em que o artista confirma a predição da cigana com os versos “minha vida é andar por este país / pra ver se um dia eu descanso feliz”… Um monumento que sintetiza a pluralidade do país e em particular o encontro do Rio de Janeiro com o Nordeste brasileiro.