Dos estivadores da Serrinha vem a resistência

O ano era 1947. No morro da Serrinha, em Madureira, um grupo de estivadores do Sindicato do Trabalhadores em Trapiche e Café –  também conhecido como Sociedade da Resistência dos Homens Pretos e fundado em 1905 – criou o Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano. A inauguração do Império remete à dissidência de uma outra escola de samba, a Prazer da Serrinha, fundada em 1930. A ideia da escola foi gestada nas casas das famílias do morro, muitas delas habitadas por trabalhadores da zona portuária que, no início do século XX, migraram para bairros distantes do centro, mas entrecortados pela linha férrea.

Sebastião Oliveira , trabalhador portuário, membro da Sociedade de Resistencia e fundador do Império Serrano. Fonte: Arquivo público do Estado de São Paulo

Assim, a relação dos trabalhadores com o samba e o carnaval deixou de ser limitada à zona portuária e a zona norte se tornou, também, um reduto de tradições carnavalescas. Sob orientação de Mano Elói – presidente da Sociedade da Resistência, grande incentivador da fundação de escolas de samba e morador da Serrinha – o Império Serrano despontou como um importante reduto de lazer e luta política – uma escola de samba inspirada nas redes de sociabilidade negras. Seu primeiro presidente foi João Gradim, genro de Mano Elói. 

Elói Antero Dias, estivador e fundador do Império Serrano. Wikimedia Commons

Ainda hoje, décadas depois de sua fundação, o G.R.E.S. Império Serrano nutre uma forte memória afetiva pelos trabalhadores da estiva. Em 2001, o enredo da escola exaltou os trabalhadores portuários da cidade. Intitulado como O Rio Corre Para o Mar, o samba, que tinha Arlindo Cruz como um de seus autores, cantava a luta dos estivadores e a criação do primeiro sindicato do Brasil:

…Abriu o porto ioiô, é porta aberta iaiá
É o comércio, é o progresso da cidade
E a cidade cresceu, o mundo então conheceu
O berço da felicidade
Toda ladeira cantou, a freguesia sorriu
A velha praça inteira aplaudiu

E assim nasceu a estiva
O primeiro sindicato do Brasil (bis)…

(Arlindo Cruz, Maurição, Carlos Sena, Elmo Caetano)

Ala “Os trabalhadores da estiva”, do desfile de 2001.

Em 2015, com um enredo sobre o próprio morro da Serrinha e o poeta Silas de Oliveira, o Império Serrano exaltou novamente a Sociedade da Resistência e os estivadores que chegaram ao subúrbio carioca no início do século XX.

…Quando o jongo me chamou eu louvei Maria
E no toque do tambor tem magia
Veio gente da estiva, da Resistência também
Todo mundo chegou no balanço do trem…

(Arlindo Cruz, Aloísio Machado, Arlindo Neto, Zé Gloria, Andinho Samara e Lucas Donato)

Essa memória afetiva, constantemente presente nos enredos do Império Serrano, evidencia os vínculos da instituição com as classes operárias  cariocas do início do século XX, quando a luta política dos estivadores se aliava à necessidade de promover instituições recreativas e de sociabilidade que possibilitassem o lazer para além dos espaços de trabalho. Os trabalhadores do porto mostraram, e ainda mostram, que festejar e brincar o Carnaval também é fazer política.

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