D. Maria do Buraco Fundo: o coração solidário do Parque União

Aluno: Caio Miguel Pereira Silva
Turma: 2002

O aluno elaborou um trabalho sobre Dona Maria de Lourdes Martins, conhecida como Dona Maria do Buraco Fundo. Figura marcante na comunidade do Parque União, na Zona Norte do Rio de Janeiro, Dona Maria foi uma mulher extraordinária, cuja trajetória se confunde com a própria história de resistência e solidariedade do território. O trabalho resgata seu legado de amor, coragem e cuidado com os outros, reconhecido e lembrado até hoje pelas vielas da favela. Confira abaixo:

“Um exemplo de generosidade e luta comunitária na Zona Norte do Rio de Janeiro”


D. Maria de Lourdes Martins, carinhosamente conhecida como D. Maria do Buraco Fundo, foi
uma mulher extraordinária cujo legado de amor, coragem e solidariedade ainda ecoa pelas vielas
da comunidade do Parque União, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Reconhecida por muitos
como a “Mãe dos Pobres”, ela transformou sua própria casa em um verdadeiro abrigo para os
mais necessitados, oferecendo não apenas um teto, mas também afeto, alimento e esperança a
todos que batiam à sua porta.
Ao longo de sua vida, D. Maria acolheu mais de 40 filhos adotivos, além de criar com carinho
seus seis filhos biológicos. Ela tratava todos como iguais, sem distinção de sangue ou origem.
Muitas vezes, mães em situação de extrema vulnerabilidade deixavam seus filhos sob seus
cuidados, algumas sem jamais retornar. Ainda assim, D. Maria nunca hesitou: acolhia, educava e
alimentava essas crianças com a mesma dedicação que tinha por seus próprios filhos.
Era uma mulher de profunda fé, ela era rezadeira e umbandista. Sua espiritualidade era vivida na
prática cotidiana. Com simplicidade e devoção, organizava procissões, festas religiosas e
celebrações comunitárias, reunindo moradores em atos de fé e solidariedade. A procissão de
São Sebastião, celebrada no dia 20 de janeiro, e a tradicional festa de São Cosme e Damião, em
27 de setembro, eram alguns dos momentos mais aguardados do ano. Nessas datas, ela
preparava pratos típicos como canjica e angu, que eram distribuídos gratuitamente a todos da
comunidade, especialmente às crianças.
Sua casa era também um espaço de convivência com a natureza. Dona Maria criava porcos,
galinhas, patos e cabritos, que alimentavam sua grande família. Ela mesma cuidava dos animais,
fazia as castrações, preparava os abates e aproveitava cada parte para garantir que nada fosse
desperdiçado. Quando chegava o dia de feira, saía com os filhos e outras crianças para catar a
xepa – os restos de frutas, legumes e verduras deixados para trás pelos feirantes – e
transformava aquilo em refeições nutritivas, sempre com criatividade e dignidade.
D. Maria era muito mais do que uma cuidadora: era uma líder comunitária nata, uma mulher
guerreira, destemida, que não tinha medo de dizer o que pensava e lutar pelos direitos de todos.
Ela foi uma das fundadoras do Parque União, em 1962, quando a comunidade ainda era formada por barracos de madeira e chão de barro. Lutou por melhores condições de vida para os moradores, sempre com a força da palavra e o exemplo do trabalho.

Sua filha, Alice de Almeida Lima, relembra com emoção: “Ela não diferenciava ninguém. Tratava
todo mundo igual, como se fosse da família.”

Segundo Alice, quase ninguém conheceu sua mãe como Maria de Lourdes Martins. O marido
dela era o João do Tempero e ela Maria do Buraco, mas ela não gostava do apelido que ganhou
durante uma festa junina. Ninguém soube explicar o motivo deste apelido.

Já Jorge Ramos Soares, comerciante e ex-morador do Parque União, compara sua generosidade
à de figuras históricas: “Ela me lembra a Madre Teresa de Calcutá. Mesmo na pobreza e
simplicidade, ajudava todo mundo com o coração.”

Infelizmente, D. Maria faleceu aos 65 anos, vítima de complicações cardíacas. Sua morte foi
sentida como uma perda coletiva. No dia do seu velório, mais de três ônibus lotados e inúmeros
carros levaram pessoas de todas as partes para prestar sua última homenagem. Seu nome, hoje,
batiza uma rua no setor conhecido como Sem Terra, no Parque União – uma forma simbólica de
manter viva a presença de alguém que sempre fez morada no coração da comunidade.

Patrocínios

Parceiros

Realização

Pular para o conteúdo