“Por meio de seus remanescentes arqueológicos,
os pretos novos podem elevar a sua voz silenciosa
para fazer parte, pela primeira vez,
da memória brasileira.”
Trecho de “Fronteiras da Escravidão”
de João Carlos Nara Júnior

O Cemitério de Pretos Novos do Largo de Santa Rita representa um dos capítulos mais trágicos e significativos da história do Rio de Janeiro colonial. Localizado em frente à Igreja de Santa Rita, no coração do centro antigo da cidade, o cemitério funcionou entre 1722 e 1769, sendo o primeiro espaço destinado exclusivamente ao sepultamento de africanos escravizados, em geral jovens, que sucumbiam durante travessia atlântica ou nos primeiros dias em terra, vítimas de doenças, desnutrição, violência e das condições desumanas de transporte.

Seus corpos eram amontoados, queimados e enterrados sem qualquer ritual ou respeito à dignidade humana.

A localização inicial do cemitério, em pleno centro urbano, gerou intensas reclamações de autoridades e moradores, incomodados com a proximidade da morte à vida cotidiana. Durante a administração do Marquês do Lavradio, em 1774, decidiu-se transferir o cemitério e o comércio de pessoas para o Valongo, em uma tentativa de ocultar o horror do tráfico da vista dos cidadãos.

Em 2018, o antigo local do Largo de Santa Rita foi redescoberto durante as obras da Linha 3 do VLT, revelando vestígios arqueológicos do século XVIII. Como resultado de um acordo entre o poder público e movimentos negros, optou-se por preservar os restos mortais no subsolo, sem escavação nem análise, como forma de honrar a memória das vítimas. O sítio foi demarcado, e o traçado do VLT ajustado para respeitar a área.

Hoje, o Largo de Santa Rita apresenta-se como espaço de memória e reparação, simbolizado por uma rosa negra no centro do piso em referência ao emblema utilizado, no século XIX, pelos movimentos abolicionistas. O local, assim, transformou-se em um lugar de homenagem e reflexão sobre a violência e a resistência da população africana escravizada.