Dengue, Zika e Chikungunya

“Aedes Aegypt” – Beth Thunder – 2015

Quando foi descrito cientificamente pela primeira vez, em 1762, ninguém imaginava que o Aedes aegypti – pequeno mosquito de origem africana – se tornaria mundialmente conhecido como um dos maiores vetores de transmissão de doenças em regiões tropicais e subtropicais.

O primeiro passo nesse processo de globalização foi dado ainda no século XVI com as grandes navegações. E como não poderia deixar de ser, o Rio de Janeiro entrou na rota do pernilongo e foi acometida com surtos de febre amarela – doença transmitida pelo Aedes aegypti – entre os séculos XIX e XX.

“Mosquito em Foco” – Exposição ensina como combater o mosquito e quais doenças transmite. Fundo Correio da Manhã/ Arquivo Nacional

Já no final do século XX, na década de 1980, o Rio conheceu a face epidêmica de mais uma doença disseminada pelo mosquito: a dengue. Entre 1986 e 1991, a nova praga foi notificada 113 mil vezes na cidade do Rio de Janeiro. Inicialmente confundida com febre tifoide, a epidemia provocava sintomas já bem conhecidos dos cariocas: febre alta, dores musculares e manchas na pele, com uma duração média de 7 a 10 dias. Na época, os cariocas mais velhos apelidaram o pernilongo transmissor de “Lacerdinha”: além de clara alusão ao ex-governador da Guanabara, o nome havia se popularizado nos anos 1960, quando as ruas do Rio foram infestadas por um mosquito de outra espécie.

Documento confidencial do escritório central do antigo Serviço Nacional de Informações (SNI) investiga a evolução da epidemia de dengue no Rio e na Baixada Fluminense. 14/07/1986. Arquivo Nacional.

As campanhas de combate ao vetor envolviam a passagem do “fumacê” pelas ruas e a eliminação de criadouros espalhados pela cidade: entulhos, caixas-d’água abertas, calhas, pneus velhos… De vasos de planta a piscinas abandonadas, tudo que acumulasse água merecia atenção. Principalmente no verão, quando as temperaturas são mais elevadas e tornam o ambiente ainda mais propício para o desenvolvimento do mosquito. 

Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, realiza ação de combate a dengue no Sambódromo. Rio de Janeiro, 26 de janeiro de 2016. Foto de Paula Johas/PCRJ/Fotos Públicas

A prevenção mostrou resultados mas nunca chegou a eliminar definitivamente o Aedes aegypti. Enquanto isso, o vírus transmitido pela picada do mosquito se aprimorou: ainda nos anos 1990, a população acompanhou, assustada, o surgimento da variante hemorrágica da dengue, mais agressiva e letal. Dali para frente, o Rio de Janeiro – um dos principais focos da dengue no Brasil – passou a conviver com quatro sorotipos do vírus.

E, a cada novo verão carioca, vinha a desanimadora perspectiva de um recorde epidêmico. As maiores epidemias ocorreram em 1986, 1991, 2002, 2008, 2011, 2012 e 2013. Em 2002, por exemplo, foram contados 146 mil casos de dengue – cerca de 2% da população daquele ano. 

Mapa sobre a evolução da epidemia de dengue e seu combate. Arquivo Nacional.

E a partir de 2015, outras duas doenças transmitidas pela picada do Aedes aegypti entraram no radar dos cariocas: o zika e a chikungunya. O zika é um vírus da mesma família da dengue foi descoberto em 1947, em Uganda; já o segundo foi identificado pela primeira vez na Tanzânia, em 1952. Apesar de apresentarem quase os mesmos sintomas da dengue – com quadro clínico leve e baixo índice de letalidade –, logo se percebeu que as infecções pelo zika vírus estavam associadas ao desenvolvimento de complicações neurológicas, como a síndrome de Guillan-Barré – doença autoimune que gera fraqueza muscular progressiva. Além disso, o vírus da zika acabou se tornando temido por outra triste consequência: gestantes infectadas passaram a apresentar alta probabilidade na formação de fetos com microcefalia. 

No auge da epidemia de 2016, o Rio se preparava para sediar a 31ª edição das Olimpíadas. Em meio à expectativa de alta circulação de turistas pela cidade, um grupo de mais de 100 médicos e cientistas internacionais enviaram carta aberta à Organização Mundial da Saúde (OMS) solicitando o adiamento ou cancelamento dos Jogos. Em questão de dias, diziam eles, a epidemia de zika poderia se tornar uma grave pandemia. Na época, a OMS não viu motivos para adiar ou cancelar o evento mas, em nota, reforçou a recomendação de que mulheres grávidas não viessem para o Rio. 

Os Jogos Olímpicos de 2016 aconteceram e, de fato, o Rio não se tornou um celeiro exportador de moléstias tropicais. Contudo, os surtos de dengue, zika e chikungunya acabaram entrando para o cotidiano da cidade. Entre 2018 e 2019, por exemplo, a prefeitura do Rio registrou um aumento de 298% nos casos de chikungunya. A disseminação do Aedes aegypti tornou-se tão certa quanto o verão carioca.  

Diante disso, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) passou a conduzir no Brasil as atividades da World Mosquito Program (WMP), uma iniciativa internacional que reúne 11 países em torno de operações que visam mitigar a transmissão dos tais “arbovírus” (vírus transmitidos por mosquitos). E o método desenvolvido pelo programa acabou ficando conhecido como “Aedes aegypti do bem”. Trata-se de inocular no bicho um microrganismo intracelular chamado Wolbachia, que impede o desenvolvimento dos vírus da dengue, da zika, da chikungunya e da febre amarela. Depois que os mosquitos com Wolbachia são liberados no ambiente, eles se reproduzem com os demais e ajudam a criar uma geração livre de vírus. 

Imagem microscópica do vírus da zika (pontos pretos) em tecido humano. 16/02/2016. Cynthia Goldsmith/ CDC

E parece que a iniciativa tem surtido efeito. Entre março de 2019 e junho de 2020, a prefeitura do Rio registrou uma queda quase 90% no número de casos de chikungunya, zika e dengue. De qualquer forma, todo cuidado é pouco. Apesar da modernização dos recursos profiláticos, segue no horizonte o risco de novas epidemias transmitidas pelo Aedes. Por isso, a boa e velha eliminação de focos de reprodução do mosquito ainda é a prevenção mais eficaz: #NãoDeixeAguaParada #CombateAedes.

Este texto foi elaborado pelo pesquisador Danilo Marques do Projeto República (UFMG).

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