Mestre Valentim

Se antes dos impactos da “Missão Francesa” (1816) a cidade do Rio de Janeiro não era a mais privilegiada para se encontrar um debate moderno sobre pintura e escultura, isso não quer dizer que, desde o século anterior, outros tipos de artistas não tenham sido fundamentais para dar um rosto urbano à cidade. Dentre eles, figura a obra de Valentim da Fonseca e Silva, ou simplesmente Mestre Valentim (1745-1813). Filho de um português com uma escravizada, nascido em Minas Gerais, ainda jovem foi com os pais para Lisboa e na metrópole desenvolveu seu talento para os ofícios ligados à arte.

Detalhe de pintura atribuída a João Francisco Muzzi. No primeiro plano, estão o vice-rei D. Luiz de Vasconcelos e o Mestre Valentim. Wikimedia Commons

Ao voltar definitivamente para o Brasil em meados de 1770, já sem o pai, decide morar no Rio de Janeiro e abrir uma oficina. Aos poucos, ele se torna um dos principais nomes na execução de obras sacras e igrejas, além de obras públicas como diversos chafarizes e a mais conhecida de todas: o Passeio Público. Escultor, entalhador, arquiteto e urbanista, Valentim teve suma importância na construção da paisagem carioca ainda durante o período colonial. Durante a administração do vice-rei Dom Luís de Vasconcelos e Sousa (1740-1807), Valentim planejou e executou obras inclusive ligadas ao saneamento e abastecimento de água.

O artista, formado em Portugal durante a fase de reconstrução de Lisboa – após o terremoto de 1755 -, adota tanto o estilo pombalino neoclássico português, quanto as marcas do rococó colonial brasileiro. Suas talhas religiosas em Igrejas como da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo ou a Capela do Noviciado da Ordem, demonstravam essa capacidade de Valentim em adaptar diferentes estilos, indo da sobriedade pombalina ao barroco joanino.

Nas obras públicas contratadas por Dom Luís Vasconcelos e Sousa, Valentim também mostrou ecletismo, apesar de se adequar à demanda iluminista das reformas propostas em período comandado pelo Marquês de Pombal e seu vice-rei no Rio de Janeiro. A execução do Passeio Público entre 1779 e 1783 (com a colaboração do pintor Leandro Joaquim e os decoradores Francisco dos Santos Xavier e Francisco Xavier Cardoso de Almeida) demonstrava esse ideal de ordenamento e beleza, em que a natureza se adapta à ação do homem. Apesar de alterado pela reforma de Auguste François Marie Glaziou na década de 1860, o espaço se tornou, desde sua inauguração, uma referência da vida urbana da cidade.

Mestre Valentim, “Fonte dos Jacarés”, 1783. Foto: Secretaria de Conservação do Rio de Janeiro. Os jacarés em bronze foram fundidos na Casa do Trem e se encontram até hoje no Passeio Público.

Dentre os diversos chafarizes e monumentos que Mestre Valentim produziu para o Rio, sem dúvida os mais significativos são o Chafariz do Carmo, hoje localizado na Praça XV, o Chafariz das Marrecas, no Passeio Público, o Chafariz das Saracuras (1795), atualmente localizado na Praça General Osório, além de peças para Igrejas como de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte, cujo altar-mor e o portal de entrada são do Mestre Valentim.

Detalhe do altar-mor da Igreja de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte, no centro do Rio. Foto: site sanctuaria.art

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